segunda-feira, 24 de maio de 2010

O que envolve uma inspeção D

Com o avião estacionado no hangar (um enorme conjunto de áreas de serviços aeroviários, almoxarifados e armazéns) a equipe de manutenção entra em ação. Mesas de trabalho, plataformas e andaimes são levados sobre rodas para seus respectivos lugares, dando acesso a partes do avião normalmente inacessíveis. Assentos, pisos, divisórias, painéis de teto e de laterais, galleys, lavatórios e outros equipamentos são desmontados ou removidos do avião para uma inspeção rigorosa. O avião é basicamente “estripado”. Seguindo passo a passo as instruções, os profissionais examinam o avião em busca de sinais de fissuras ou de corrosão nos metais. Seções inteiras do trem de pouso, dos sistemas hidráulicos ou das turbinas podem ser substituídas como parte da inspeção. A inspeção D demanda as habilidades de engenheiros, redatores técnicos, inspetores de controle de qualidade, técnicos em aviônica, profissionais de chapas de metal e mecânicos da parte estrutural e de motores (turbinas), a maioria dos quais licenciados oficialmente. Quando se acrescenta a isso os mecânicos de equipamentos de cabina, pintores e faxineiros, o número da equipe de manutenção sobe para bem mais de 100 por dia. Muitos outros provêem equipamentos essenciais, peças e apoio logístico.

Com o tempo, as vibrações do vôo, os ciclos de pressurização da fuselagem e os sacolejos de milhares de decolagens e de pousos provocam fissuras na estrutura metálica. Para enfrentar esse problema, a aviação utiliza princípios de diagnóstico similares aos da medicina. Ambas usam recursos como a radiologia, a ultrasonografia e a endoscopia para detectar o que o olho humano não vê.

Num exame de raio X comum, o paciente fica entre um filme e um feixe de raios X. Para tirar raios X do trem de pouso, das asas e das turbinas, os inspetores de manutenção usam métodos similares. Por exemplo, um filme de raio X é colocado num desejado ponto na parte de fora da turbina. A seguir, coloca-se um longo tubo de metal no eixo do motor. Por fim, uma pastilha de irídio radioativo 192 — um poderoso isótopo — (não maior do que a borrachinha na extremidade de um lápis) é colocada no tubo para expor o filme de raio X. O filme revelado ajuda a indicar fissuras e outras falhas que talvez requeiram que o motor seja reparado ou substituído.

Durante a inspeção D, amostras do combustível do avião e de seus fluidos hidráulicos são enviados para análise laboratorial. Se forem encontrados microorganismos na amostra de combustível, são prescritos antibióticos. Para destruir esses microorganismos — fungos e bactérias que podem penetrar nos tanques através do ar, da água e do próprio combustível — os tanques são tratados com um biocida, uma espécie de antibiótico. Esse tratamento é importante, pois os derivados do crescimento microbiano podem corroer os revestimentos na superfície dos tanques. Podem também alterar a exatidão dos indicadores de reserva de combustível.

Por causa do desgaste natural, de vibrações e de danos na vedação, os tanques de combustível podem apresentar vazamentos. O supervisor pergunta à sua equipe de inspeção D: “Quem deseja ser o homem-rã?”. A pouco divertida, porém necessária, tarefa coube a John. Parecendo um mergulhador sem nadadeiras, ele veste um macacão especial de algodão, coloca um respirador ligado a um suprimento de ar fresco e carrega ferramentas, selante e uma luz de segurança. Por uma pequena abertura embaixo da asa ele se esgueira até o tanque vazio na asa, localiza a fonte do vazamento e a veda.

Os tanques de combustível de um 747, embutidos nas asas do avião, são um labirinto de compartimentos ligados por pequenas aberturas. Não é lugar para quem sofre de claustrofobia. Um 747-400 pode armazenar mais de 210.000 litros de combustível. Com isso dá para cobrir rotas extremamente longas sem escala, como de São Francisco, nos EUA, a Sydney, na Austrália — uma distância de 12.000 quilômetros.

A uma altura de três andares, na cabina de comando, um técnico em aviônica inspeciona um embutido display de checagem do radar de tempo, numa tela parecida com a de uma TV. Os pilotos usam esse instrumento para detectar e evitar tempestades e turbulências até uns 500 quilômetros à frente do avião. Assim, quando o piloto liga o aviso “Aperte o cinto de segurança”, ele talvez tenha visto turbulência na tela de radar. Contudo, para prevenir ferimentos, muitas linhas aéreas pedem que os passageiros usem o cinto de segurança o tempo todo, mesmo que o comandante desligue o aviso. Turbulências em áreas de céu limpo às vezes surgem sem que o piloto tenha tempo de ligá-lo.

Na inspeção D os equipamentos de segurança, como coletes salva-vidas e luzes de emergência, são checados ou substituídos. Durante a inspeção do sistema de oxigênio de emergência dos passageiros, as máscaras de oxigênio pendem como laranjas dos galhos. Os jatos rotineiramente voam a uma altitude de 6 a 11 quilômetros, onde a presença de oxigênio e a pressão atmosférica são insuficientes para sustentar a vida. Como se resolve esse problema? O sistema de pressurização do avião suga o ar de fora e daí o comprime. Esse ar é então liberado para as cabinas numa temperatura confortável. Se a pressão do ar nas cabinas desce a níveis perigosos, as máscaras de oxigênio automaticamente caem de compartimentos no alto. O oxigênio de emergência é suprido aos passageiros até que o avião desça a uma altitude em que o oxigênio de emergência não seja mais necessário. Há aviões em que as máscaras de oxigênio ficam no encosto dos assentos, não no alto. Por isso, é importante prestar atenção às instruções transmitidas antes do vôo, que indicam a localização das máscaras de oxigênio.

Na inspeção grande é também tempo de instalar novas divisórias e painéis de teto e de laterais, bem como de substituir carpetes, cortinas e estofamentos de assentos. As galleys são desmontadas, limpas e esterilizadas.

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